A Narração II

Crônica: O cotidiano visto por olhos especiais

Outro gênero da narrativa no qual podemos identificar a apresentação de acontecimentos, sem que haja, a elaboração e o aprofundamento encontrados em uma narrativa, é a crônica.

Diferentes tipos de crônica
A crônica pode receber diferentes classificações, dependendo do tema por ela desenvolvido. Assim, fala-se da crônica mundana (trata de fatos ou acontecimentos característicos de uma sociedade), lírica (expressão de um estado de espírito do cronista), filosófica (reflexão a partir de um fato ou evento), humorística (visão irônica ou cômica dos fatos apresentados) e jornalística (apresentação periódica de aspectos particulares de noticias ou fatos; pode ser policial, esportiva, política etc.).

Veja um exemplo de crônica que pode ser definida como mundana, porque seu autor enumera uma serie de fatos desagradáveis que, cotidianamente, nos fazem perder o bom humor.

Desabafo

“Desculpem-me, mas não dá pra fazer uma cronicazinha divertida hoje. Simplesmente não dá. Não tem como disfarçar: esta é uma típica manhã de segunda-feira. A começar pela luz acesa da sala que esqueci ontem à noite. Seis recados para serem respondidos na secretária eletrônica. Recados chatos. Contas para pagar que venceram ontem. Estou nervoso. Estou zangado.

É preciso denunciar os crimes que a vida moderna comete contra a criatura humana. Lembrei-me de uma crônica dos anos 60 do Paulo Mendes Campos. ‘Coisas abomináveis’. Ele lista as violências cometidas contra o pobre bicho-homem, da vacina antivariólica à ‘moça que não sabe que mulher só pode falar um palavrão por semana’. Mas é preciso atualizar a lista das coisas abomináveis. Aqui vai meu grito de guerra.

Os reality shows. Ficar ouvindo conversa de gente que comenta os reality shows. Ir a um restaurante e sentar à mesa ao lado de seres que participaram de reality shows. Chegar em casa e reparar que só tem um recado na secretária eletrônica no domingo.

O recado é de alguém querendo vender plano de saúde. Fila pra pagar estacionamento em shopping Center. Boleto bancário. Carnê do IPVA e do IPTU. Gente que fura a fila. Engarrafamento em São Paulo. Engarrafamento naquelas ruazinhas de Botafogo. Motorista que enfia o carro na sua frente. Motorista que rouba a sua vaga. Fila de repartição pública. Funcionário que repete que o expediente acabou e que é pra voltar no dia seguinte. Gerente de banco que quando você pergunta se o dólar vai subir ele responde que ‘pode baixar, subir ou continuar n mesmo patamar’. Acampar em Mauá com chuva. [...] Perder a carteira. Perder a chave de casa. Ir ao dentista. Conta de dentista. Jornal largando tinta. Meia molhada.

Chega! Na próxima crônica, prometo escrever sobre as coisas maravilhosas da vida no planeta. E obrigado por ouvirem o meu desabafo.”
CARNEIRO, João Emanuel. In: Veja/RJ, 11 set. 2002.


PROPOSTA DE PRODUÇÃO DE TEXTO

Você acabou de ler uma crônica em que João Emanuel Carneiro identificou uma série de acontecimentos irritantes que acontecem com freqüência na vida de um adulto de meia-idade. No fim do texto ele promete que sua próxima crônica será sobre as coisas maravilhosas da vida no planeta.
Transcrevemos, a seguir, algumas passagens dessa crônica.

Ainda bem

“É verdade que o mundo moderno na maioria das vezes transforma nossa vida num inferno. Mas há exceções. Por exemplo:

Descobrir que o elevador já está no seu andar. Comida de restaurante entregue em casa – de preferência um bacalhau à lagareria numa tarde chuvosa de domingo. Água de geladeira. Pacote cheio de sorvete que você tinha esquecido no congelador. Aliás, como era possível a vida antes do sorvete? [...]

Um bom sofá macio. Uma longa chuveirada. Dia em que não se tem que fazer absolutamente nada. Uma brisa fresca inesperada em meio a um dia quente.”

CARNEIRO, João Emanuel. In: Veja/RJ, 11 set. 2002.


Agora é a sua vez! Escreva uma crônica em que você identifique os pequenos acontecimentos que marcam nosso dia-a-dia e nos enchem de alegria.

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